Trotes para PM e Samu reduzem mais de 70% nos últimos cinco anos no Distrito Federal
Polícia Civil indiciou 13 pessoas pela prática ao longo dos últimos oito anos; instituições alertam riscos da atitude
Brasília|Edis Henrique Peres, do R7, em Brasília

Os serviços de saúde e de segurança do Distrito Federal registraram uma queda de mais de 70% no número de trotes recebidos nos últimos cinco anos. Segundo dados levantados pelo R7, o número caiu de 28 mil, em 2020, para 7.400, no ano ado, considerando trotes para a PM (Polícia Militar do DF) e para o Samu (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência). De 2016 até hoje, a Polícia Civil indiciou pelo menos 13 pessoas pela prática.
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Diretor do Samu, Victor Arimatea explica que o trote atrapalha e muito o serviço prestado pelos profissionais. “Ao longo do dia a quantidade de chamados varia e pode comprometer o tempo de atendimento de outros pacientes, incluindo vítimas potencialmente graves e que dependem de um tempo-resposta para ter o atendimento necessário e o melhor desfecho possível. Atendemos desde ocorrências clínicas a traumáticas, desde pacientes pediátricos quando adultos e idosos. O trote, independente da quantidade, traz prejuízos para a operação de socorro e a métrica desejada sempre será o trote zero!”, defende.

Ele conta que hoje o Samu conta com um filtro que consegue reduzir os trotes que chegam aos atendentes. “O Sistema SAU foi customizado para atender às necessidades do serviço e gradativamente foi ajustada e implementada com novas funcionalidades. Atualmente temos um processo que mediante o registro de trote classificado e confirmado pelo profissional telefonista, caso haja reincidência dentro de um período de 15 minutos, a ocorrência a a ser identificada com um símbolo (alerta para o atendente dar mais atenção ao caso). Caso o atendente confirme o trote novamente, ele pode solicitar via sistema para o supervisor o bloqueio temporário do número”, explica.
Arimatea detalha que somente o supervisor tem a prerrogativa “que é tomada depois de todas as etapas para garantir o devido cuidado com o chamado”. “Novas ligações igualmente dentro de um novo intervalo de 15 minutos são temporariamente bloqueadas e contabilizadas como ‘rejeitadas pelo sistema’”, pontua.
No ano ado, por exemplo, além dos trotes qualificados pelo operador, foram registrados 5,3 mil trotes rejeitados pelo sistema. Para o diretor do Samu, a redução nos últimos anos aconteceu com a aproximação do serviço com as atividades educativas, como o projeto Samuzinho.

“É claro que há uma dificuldade em estabelecer uma relação direta entre as ações desempenhadas e o impacto na redução do registro de trotes, mas entendemos que de forma conjunta as iniciativas de educação e divulgação foram as melhores estratégias”, diz.
Ele cita que todo ano o Samu tem colaborações com veículos de divulgação e uma extensa agenda do Núcleo de Educação em Urgências junto a profissionais instrutores do serviço, realizando atividades nas escolas, em eventos, stands de divulgação promovidos pelo Governo do DF ou Ministério da Saúde.
“E todos servem de vitrine para destacar o serviço, sua complexidade e a importância da colaboração de todos, desde o conhecimento sobre como e quando acionar o serviço quanto para evitar desvios como a realização de trotes”, defende.
Trotes para a PM
Em nota, a PMDF ressaltou que a cada chamada indevida, recursos essenciais são desviados de quem realmente precisa de ajuda. “Para combater essa prática, o Governo do Distrito Federal implementou o Decreto nº 44.427/2023, que regulamenta a Lei Distrital nº 6.418/2019. A norma prevê multas para quem realizar trotes, que podem chegar a três salários mínimos, caso os serviços de emergência sejam acionados indevidamente”, explica.
A PM revela que desde a entrada em vigor do decreto, e com o reforço na conscientização da população, houve uma redução de 24,24% nos trotes entre o primeiro e o segundo semestre de 2024. “Comparando o segundo semestre de 2024 com o mesmo período de 2023, a queda foi de 20,63%. Esses dados demonstram o impacto positivo da legislação e da mobilização social na redução das chamadas indevidas”, explica.
A corporação acrescenta que “trotes não são brincadeira e podem resultar não apenas em sanções legais, mas também no atraso ou impossibilidade de socorro para quem realmente precisa”.
Segundo a PM, a população pode colaborar denunciando o uso indevido dos números de emergência e orientando familiares e amigos sobre a importância de evitar ligações falsas. “A segurança de todos depende do uso consciente desse recurso essencial”, alerta.
O que diz a lei?
Advogada especialista em direito penal, Jessica Marques explica que o trote não está tipificado na legislação como crime próprio, no entanto, o conteúdo e as consequências dele podem ser puníveis, a depender de cada situação.
“Atualmente, temos alguns tipos penais que podem ser utilizados para responsabilizar quem a um trote, como, por exemplo, o artigo 41 da Lei de Contravenções Penais que prevê a responsabilização de quem provocar alarme anunciando perigo ou desastre inexistentes ou qualquer ato capaz de produzir pânico ou tumulto”, explica.
Ela acrescenta que os artigos 339 e 340 do Código Penal também podem ser usados, para os casos de comunicação falsa de crime; e os artigos 265 e 266 do Código Penal para os casos de interrupção de serviços públicos. “Além disso, há várias outras previsões dentro do ECA para os casos em que o autor do trote seja criança ou adolescente”, pontua.
Segundo ela, o maior desafio é encontrar o autor dos trotes. “Geralmente, os trotes são realizados por meio de telefones públicos ou números sem identificação. Além disso, a maioria dos autores são crianças e adolescentes, o que dificulta a punição, já que não há previsão de pena para eles, mas de no máximo a imposição de uma medida socioeducativa. Logo, não há dúvidas que o trabalho de conscientização deve ser constante e ampliado para repudiar o ree de trotes que pode gerar consequências irreversíveis”, finaliza.